1ª PARTE
DEDICATÓRIA
Tornais, vós, trêmulas visões, que outrora
Surgiram já à lânguida retina.
Tenta reter-vos minha musa agora?
Inda minha alma a essa ilusão se inclina?
À roda afluis! reinas, então, nesta hora
Em que assomais do fumo e da neblina;
Torna a fremir meu peito com o bafejo
Que vos envolve em mágica o cortejo.
Trazei imagens de horas juvenis,
Sombras queridas, vagam no recinto;
Amores, amizades, ressurgis
Do olvido como um conto meio extinto;
Renasce a dor, que em seus lamentos diz
Da vida o estranho, errante labirinto.
Evoca os bons que a sorte tem frustrado,
E antes de mim, à luz arrebatado.
Meus novos cantos já não ouvirão
Os que me ouviram os primeiros versos;
Desfeito, ah! se acha o grupo amigo, irmão,
Ecos de outrora estão no nada imersos.
Meu canto soa à ignota multidão,
Seu próprio aplauso ecoa em sons adversos,
E o mais, que a minha lira amarra, erra,
Se vivo for, esparso sobre a terra.
E de um remoto anelo o grave encanto
Àquele reino de visões me acena;
Vibra, ora, em indecisos tons meu canto,
Qual da harpa eólia a murmurante pena,
Sinto um tremor, segue-se o pranto ao pranto,
A rígida alma abranda-se e serena;
O que possuo vejo ao longe, estranho,
E real me surge o que se foi antanho.
J.W.Goethe, Fausto.
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