"Assim, a casa sonhada deve ter tudo. Por mais amplo que seja o espaço, ela deve ser uma choupana, um corpo de pomba, um ninho, uma crisálida. A intimidade tem necessidade do âmago do ninho. Segundo seu biógrafo, Erasmo levou muito tempo 'para encontrar, em sua bela residência, um ninho em que pudesse pôr em segurança seu pequeno corpo. Acabou por confinar-se num quarto onde pudesse respirar esse ar espesso que lhe era necessário'.
"E muitos sonhadores querem encontrar na casa, no quarto, uma roupa que se ajuste a eles.
"Mas, novamente ninho, crisálida e roupa constituem apenas um momento da morada. Quanto mais condensado é o repouso, quanto mais fechada é a crisálida, quanto mais o ser que surge daí é o ser de outro lugar, maior é a sua expansão. E, passando de um poeta para outro, acreditamos que o leitor é dinamizado pela imaginação da leitura quando escuta um Supervielle no momento em que ele faz o universo entrar na casa por todas as portas, por todas as janelas escancaradas.
Tudo o que forma os bosques, os rios ou o ar
Tem lugar entre as paredes que crêem fechar um quarto
Vinde, cavaleiros que atravessais os mares,
Só tenho o teto do céu, há lugar para nós.
A acolhida da casa é tão total que o que se vê da janela pertence à casa:
O corpo da montanha hesita em minha janela:
'Como havemos de entrar se somos a montanha,
Se estamos nas alturas, com rochas, calhaus,
Um pedaço da Terra alterado pelo Céu?'
"Quando nos tornamos sensíveis a uma ritmanálise, passando da casa concentrada para a casa expandida, as oscilações repercutem, amplificando-se. Os grandes sonhadores professam, como Supervielle, a intimidade do mundo, mas aprenderam essa intimidade meditando a casa" G. Bachelard, A Poética do espaço, p.79-79.
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