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sexta-feira, 31 de dezembro de 2010

A Passagem, de passagem em Vitória da Conquista-BA

Muito elegantes essas calçadas, mas não são regras na cidade

Na praça principal, muito bem cuidada, há as marcações

Grande movimento no centro às 2 da tarde do dia 31


Todos os Deuses  e Deusas, em confabulações sigilentas, decidiram que eu estaria exatamente aqui, nessa horinha. Vitória da Conquista, Sudoeste a Bahia. Feliz 2011! São 22 horas do dia 31. Vou dormir.

quinta-feira, 30 de dezembro de 2010

E tome chuva, que é bom!

Eu esperei a noiva entrar pra fotografar.
A questão é esta: não há coisa melhor que chuva pelos lugares onde ando. Nem pensar em pedir pra parar de chover. Minha proposta é que é outra, e não envolve necessariamente chuva. Preciso então buscar o sol. Não adiantou vir para Salinas. Peguei chuva como nunca dantes. Amanhã devo seguir (a hora depende do clima) para Vitória da Conquista-BA. Vamos ver. Testemunhei um casamento agora à tarde na Matriz de Salinas.

Muita chuva e pouco sol, os males desse lugar são. Nessa época!!

É muita chuva e parece que só eu não via: chove todo dia e muito, por onde quer que eu passe. Depois de quatrro dias sem ligar TV, ontem vendo o JN tomei susto e saio agora mesmo, antes das sete desta quinta-feira em busca de sol. Vou pra onde não agora. Outra opção seria ficar aqui até a seca chegar e isso não pode ser. Saio agora mesmo em direção a Salinas e adiante. Bom dia a todos.

quarta-feira, 29 de dezembro de 2010

Januária-MG

Esta foto é de Brasília de Minas, no meio do caminho.






De São Francisco a Januária, viagem perfeita no asfalto da BR 135. Marisa Monte tomou conta da trilha mansa. Comprei um livro, uma carranca e carranquinhas para levar de lembrança. Mudei os planos novamente. Amanhã vou-me embora para Salinas.

São Francisco, 130 anos



Peixe secando ao sol

É uma casa de morador mesmo

O velho chico escorrendo pela minha janela



Depois de dar banho em Clio, almocei no restaurante da Gê, esquisito mas deu tudo certo. Andei pela cidade, fiz fotos, comprei fumo de rolo, pitei cigarro de palha, carreguei créditos no celular (que voltou a achar sinal depois de muitos quilômetros), andei pela cidade, jantei, andei pela cidade e fui para o hotel. Não li, só dormi. 

Mudando de margem





Coloquei Clio na balsa e atravessamos o Rio. Ela depois tomou um belo banho, antes mesmo que eu almoçasse. Está ali, limpinha, na garagem (coberta) do Hotel Atalaia de São Francisco-MG, onde estou hospedado no quarto 64. Fui jantar a pé, para não incomodar Clio mais naquele dia de grande heroísmo, de travessia do nosso liso do sussuarão.

Até São Francisco, que não era pra ser agora



Eu deveria ter adivinhado já nesse visual,

Preciso voltar aqui. Preciso saber se alguém já escreveu sobre esse lugar.

Esse é um cartão postal famoso de Serra das Araras

Impressiona a desproporção da construção em relação às casas do lugar

A serra debaixo de chuva

O caminho para o posto de saúde: eu procurava o Adailton, filho da presidente da Associação das bordadeiras.


A placa é claríssima: eu devia virar à esquerda, Fui em frente, porque, de certo, era pra ir.

É claro que eu fui para São Francisco. Evidente.

Mudei de novo o roteiro, agora em função do clima. Na verdade a relação chuva e estrada. Originalmente, pretendia deixar a Chapada para atravessar o Rio São Francisco em São  Romão. A atenciosa Polícia Mineira e técnicos da CEMIG me convenceram, com 2 minutos de conversa, de que eu só podia ser doido para pegar essa estrada com um “carrinho” daquele que eu dirigia. O carrinho era Clio, a Musa da História. Provaram que nesse tempo, nessa época, só passam ali caminhonetes ou carros traçados, fora disso só sendo maluco. O convencimento veio rápido por causa dessa palavra usada por eles: eu não sou maluco. Decidi então: deixaria a Chapada, passaria por Serra das Araras, um vilarejo (que estava nos planos) e iria direto pra Januária, atravessando o Velho Chico de ponte e não de balsa, como planejado. Veja só o destino. Despedi-me de todos, agradecido, e peguei a estrada. Passei Serra da Araras e, pronto, errei o caminho e peguei rumo de São Francisco, o segundo pior caminho, segundo os técnicos. Rodei 80 quilômetros sem fumar nem ouvir música, apenas com Clio, Deus e Nossa Senhora. Lama e atoleiro, muitas caminhonetes, pickups e esses outros traçados e só eu com Clio. Mas tinha motoqeiro maluco também e com motoqueira maluca na garupa também tinha. Já no final, algo como os últimos 15 quilômetros alcancei um Uno azul, placa de São Francisco. Ora, era um carro de alguém da região, e era um carrinho como o que eu conduzia... Então era possível, sim. Quando chegamos ao asfalto, paramos, eu desci e dei voltas em Clio, gritando (agora feito um louco, mesmo). Não se via quase nada do carro, era puro barro. Peguei uma garrafa com água e lavei a placa, para aparecer a identificação. Coloquei Chico Science no volume 30 e rodei até o porto do Rio São Francisco, para tomar a balsa, como se tivesse vencido a batalha de Alcácer Quibir. Havia destruído o exército turco e estava prestes a me tornar um mito.

Coloquei Clio na balsa e atravessamos o Rio. Ela depois tomou um belo banho, antes mesmo que eu almoçasse. Está ali, limpinha, na garagem (coberta) do Hotel Atalaia de São Francisco-MG, onde estou hospedado no quarto 64.

Chapada Gaúcha










Nas lojas de esportes as opções são camisas do Inter ou Grêmio, ou do Chelsea, Barcelona, seleção da Espanha. Não nem um chaveirinho do Galo ou do Cruzeiro. Hospedei e fui almoçar no restaurante do Hotel Recanto de Minas, como já informei. Ali me esclarecerem de que eu precisava de uma autorização do IBAMA pra entrar no Parque Nacional Grande Sertão Veredas. Ótimo, pensei, tem que ser controlado mesmo. Imediatamente me lembrei: IBAMA é Federal e hoje é 27/12/10. Recesso com compensação de carga horária. Já aviso logo que não me excluo disso. Apostei comigo mesmo e ganhei: não tinha ninguém lá, mas era hora de almoço e havia uma chance à tarde. Finalmente, após vários contatos, apareceu uma funcionária (terceirizada, é claro), mas não havia nenhum guia para me acompanhar e todos os carros (três), que têm de ser traçados para rodar dentro do parque estavam estragados. Mais finalmente ainda, com o esforço da excelente funcionária terceirizada, coitada, deixada ali, conseguiu-se um guia (terceirizado, é claro) com diploma e tudo e que poderia me levar até determinados pontos do parque, no Clio mesmo. Havia ainda a alternativa de locar um carro traçado para nos levar, algo que sairia por uns 250 rerais, o que recusei prontamente, alegando escassez de recursos. Fomos e eu vi, a reserva está lá. Voltei pro hotel, li, dormi, acordei, jantei e vi, pela primeira vez na vida, uma festa de Natal no dia 27 de dezembro. A Chapada tem 30 anos de idade e já supera suas vizinhas centenárias em muitos aspectos. A cidade cresce desesperadamente, com construções por todos os lados, parece um acampamento, com todo mundo chegando e levantando suas casas. Tudo casa nova, grande, ruas sendo calçadas, árvores sendo plantadas. Dois problemas bem visíveis na Chapada: a) internet só pra quem tem celular TIM ou nas duas lan houses da cidade. Nas lans o sinal só chega após às 18 horas; b) o sertão está virando um produto por aqui, como desodorante avon. Todo mundo é revendedor Avon, digo, revendedor de sertão. Não sabem direito o que é, de onde vem, mas vendem. Uma senhora escreveu um livro (do qual comprei dois exemplares); trata-se de uma senhora simples e muito  simpática, dona de uma lojinha de brinquedos, que nasceu em Brasília, olha só, e, segundo ela depois de morar em vários lugares escolheu a Chapada, por causa do sertão, do melhor lugar do mundo, a natureza do lugar, etc, etc. Uma revendedora. Perguntei sobre essa estória de sertão, o que era. A resposta sai toda atravessada, referindo-se a um poeta que escreveu um livro, algo assim... Parece que se trata de um caso daqueles em que a vida imita a arte, mais ou menos como me disse alguém ontem, muito inteligentemente. Ou são os Gaúchos aproveitando do pretexto do Parque para acabar com tudo em volta. Gosto desta hipótese:  quanto mais soja e cana em volta mais lindo o Parque fica. O cerrado está desaparecendo ao sul da Chapada, ao sul do parque. Eu falo da Chapada porque os Gaúchos estão com fome (e sede), mas do lado de minas o parque faz divisa com Formoso, Arinos e a Chapada Gaúcha. Do lado da Bahia não sei dizer mas presumo maior proteção pelo vazio demográfico. Li durante uns três minutos e meio e dormi.

Até a Chapada








Estão “trabalhando” na pavimentação da estrada, não nessa época do ano, é claro. Choveu à noite e eu nem havia percebido. Com as obras e a chuva a pista ficou impossível e só mesmo pelas mãos de Deus não capotei Clio, a Musa da História. Escorregou, freei e piorou, acelerei e piorou, reduzi e acelerei e então caí no barranco, debaixo de chuva, cem metros depois do início da luta (ou depois do vacilo). Não fiz fotos para não assustar ninguém e as cenas que se seguiram estão apenas na minha memória e na dos que me ajudaram a resgatar Clio, segura apenas por um fio que a ligava aos Céus. Você saiu de uma pirambeira, como disse um morador do lugar. Trator, uma dúzia de carros que pararam, um guincho vindo de Arinos e eis que estamos, eu e Clio, de volta à estrada, agora rodando a 30 km/h, escutando Chico Science no volume 25 e eu dando muitos gritos de agradecimento. Gritos mesmo, com a cabeça pra fora da janela. Gritei muitas coisas, muitos nomes bonitos (juro) e agradeci por não acontecido nada além de gastar 130 reais inesperadamente. Fiz o resto da viagem até a Chapada, na velocidade estonteante já mencionada, e cheguei ouvindo Pena Branca e Xavantinho cantando Cuitelinho.

Cheguei à Chapada Gaúcha às 14 horas fui direto ao Hotel e Restaurante Recanto de Minas, que a polícia me indicou. Hospedei-me e almocei. Deve ter uma mineira na cozinha. Claro que o hotel não é de mineiros, é só nome, para evocar sabores diferentes daqueles do lugar. Acho que tudo ali pertence a gaúchos, terras, lojas, postos de combustíveis, casas de sementes, oficinas, até lan houses.

Até Arinos







Decidi almoçar em Arinos, onde estacionei no Big Hotel de Arinos, meu pouso, pouco antes das 14 horas. O hotel faz jus ao nome, pelo menos no local: é o maior da cidade, com diárias a 35 reais em quartos com TV e ventilador. Perfeito. Do lado de dentro da porta um cartaz: “o Hotel não aceita hóspedes acompanhados de mulheres da cidade”. Achei interessante, mas fiquei pensando se eles conheciam mesmo todas as mulheres da cidade. Concluí que era possível, sim. O melhor do hotel: tinha conexão sem fio com a internet.

Arinos é uma fronteira, no que diz respeito ao asfalto. Acaba ali o pixe. Eu já sabia e segui em direção em direção a Chapada Gaúcha.

domingo, 26 de dezembro de 2010

Unaí-MG





Unaí e o rio das águas que motivaram seu nome. Novidade nenhuma: devem haver umas 3000 cidades brasileiras chamadas “cidade das águas sujas”, “das águas turvas”, “escuras”, “pretas”... Ituiutaba mesmo: cidade ao lado do rio das águas turvas, o Tijuco.

Estrada de novo, agora sem chuva




Mas ainda sem sol. BSB até Unaí-MG.

Brasília, Distrito Central


Precisava passar aqui, para acrescentá-la às "cidades arbitrárias" de Lévi-Strauss. A dissertação que a Margarida defende em fevereiro talvez dê conta dessa paisagem e sobre se são "homens de lugares" ou "lugares de homens". Só li o primeiro capítulo e diz lá:

"Ademais, é preciso começar questionando a metáfora progressista da nação moderna, compartilhada por teorias orgânicas do holismo da cultura e da comunidade. Como diz Bhabha (2005), deve-se lançar mão, por uma necessidade, de reflexões que partam da problematização dos discursos produzidos à luz de tais premissas. Afinal, as imagens que temos de “pessoas dos lugares” e dos “lugares de pessoas”, em geral, estão fundadas nas produções de narrativas as quais “buscam retratar a enorme força da ideia de nação nas exposições da vida cotidiana, nos detalhes reveladores que emergem como metáforas da vida social” (p. 203, grifos do autor)"

Ainda piove...





Com chuva, quase 3 horas até Londres, digo, Brasília-DC. Deu pra sentir os 4 pneus novos em folha.

Decreto nº 0



26 de dezembro de 2010
Por decreto, eu encerro 2010 e começo a rodar... 2011.
O hodômetro marca 129.200. Km Zero. A matemática é muito engraçada mesmo: a gente convenciona que o quilômetro 129.200 é o km zero e pronto, tudo certo. Claro que não é. Mas pobres dos matemáticos se os indianos não tivessem inventado o zero. Zero é palavra entre números.

São 5h30min, tarde já, mas estou na frente do Sol. Boa viagem pra mim e todos os meus espaços vividos, anjos e demônios, sonhos, devaneios e talvez delírios, por que não?! Sei que estou sozinho e sei que não estou sozinho. Chove muito levemente, algo que o Sol deve interromper e espero que já não esteja  chovendo à altura de minha primeira parada, que não sei qual é, só imagino. Outra quase certeza: falarei sozinho muitas vezes... Chamarei alguém, pelo nome, muitas vezes...

quinta-feira, 23 de dezembro de 2010

As "seguências" de Kathrin: a primeira (p. 9-86)


"Qual é o princípio ordenador do universo?


"A abertura do romance caracteriza-se pela fala evocativa e por permanentes deslizes associativos. Em lugar de uma 'história' articulada, o narrador fornece algo como um inventário de episódios fora do lugar, ou seja, sem pontos de referência fixos. Nesse caos de fragmentos de uma história-por-vir está inserida numa série de onze causos - pequenos relatos ordenados segundo as convenções narrativas habituais. A justaposição destes dois modos de narrar - o do aparente caos das divagações reflexivas de Riobaldo e o da ordem convencional dos causos - aponta para a pergunta: 'Qual é a maneira certa de narrar?"


"Esta pergunta pela ordem ficcional é reiterada ao nível temático pela interrogação dos representantes tradicionais da Ordem: Deus e outras figuras paternas (o delegado, o padre, os pais de jagunços, o pai do Menino, etc.). A primeira sequência levanta assim a pergunta global do princípio ordenador do universo, do homem e da linguagem" Kathrin H. Rosenfield, GSV: Roteiro de leitura. (as páginas citadas sempre se referem à 12a Edição da LJO, 1976).

segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

Candido: Eça entre a cidade e o campo





ENTRE CAMPO E CIDADE

O desacato é a condição do progresso...
Quem respeita decai. (João da Ega)

Observada no conjunto, mesmo de maneira superficial, a obra de Eça de Queirós se apresenta em grande parte como diálogo entre campo e cidade – ora predominando a nota urbana, ora fazendo-se ouvir mais forte a nota rural. Numa sociedade européia do século IXI, como a portuguesa, cidade deveria significar vida moderna, intercâmbios sociais intensos, participação na civilização capitalista do Ocidente. Campo significaria tradicionalismo, economia agrária, sentido paternal nas relações entre as classes. De um lado, o banqueiro, o cientista, o técnico, o pelintra: Cohen, Julião, Jorge, Basílio. De outro, o senhor morgado, o agricultor, o apaniguado, o caseiro: Gonçalo Ramires, Zé Fernandes, o Pereira “Brasileiro”, José Casco, Melchior.
(…)
Nos Primeiros livros sentimos predominar a visão urbana da vida, mesmo quando o tema é rural ou semi-rural. (…)
(…)
Nos primeiros livros, o seu ponto de vista é o de um homem da cidade, dum crente na cultura urbana do tempo. (…)
(…)
Não obstante essa visão unilateral – e quem sabe devido a ela, – O crime do padre Amaro é um excelente livro, menos esquemático e caricatural do que outros do autor. Lembra certos quadros de Goya, feitos de preto, cinza, amarelo e escarlate (...)
(…)
O colaborador d' As farpas – para quem a salvação do país estava na introdução do progresso técnico e científico, na liquidação do paternalismo agrário – começara a deixar-se invadir pela sedução do velho Portugal. Os seus romances irão revelando, pouco a pouco, um abandono do ponto de vista urbanista em proveito do sentimento rural; em proveito daquele mesmo passado que ele a princípio renegou integralmente.
Os Maias exprimem com nitidez este recuo ideológico. (…)
(…)
De tal maneira foi se acentuando em Eça de Queirós a convicção das excelências do campo como formador de homens e reserva tradicional do caráter português, que o seu próximo livro, para muitos a sua obra-prima, será um romance rural. A ilustre casa de Ramires é o anti-Basílio. Embora os Ramires andem decadentes (pois acompanham a curva das vicissitudes do Reino), é na tradição por eles formada que o seu último rebento vai encontrar energia para obstar à decomposição do próprio caráter e afirmar uma superioridade cheia de orgulho de estirpe. Verifica-se, então, um fato da maior importância para interpretar o nosso romancista: parece que ao encontrar-se plenamente com a tradição do seu país, ao realizar um romance plenamente integrado no ambiente básico da civilização portuguesa (a quinta, o campo, a freguesia, a aldeia, a pequena cidade: Santa Irenéia, Bravais, Vila Clara, Oliveira); parece que só então Eça de Queirós conseguiu produzir um personagem dramático e realmente complexo: Gonçalo Mendes Ramires. Parece que só então pôde libertar-se da tendência caricatural e da simplificação excessiva dos traços psicológicos.
Na Ilustre casa de Ramires o romancista se comporta como homem do campo. A cidade de Oliveira é vista sob o ângulo da Torre e não, como a Leiria do Padre Amaro, do ângulo de Lisboa.
(…)
A cidade e as serras vai ainda mais longe, a ponto de romper o equilíbrio conseguido n' A ilustre casa, e é uma espécie de anti-Maias, como o segundo é um anti-Basílio.
(…)
Para o nosso intuito, porém, interessa principalmente o valor de sintoma d'A cidade e as serras, isto é, o seu significado de integração na convenção bucólica e a busca de um sentido mais harmonioso na existência campestre. As vidas dos santos, principalmente a de São Cristóvão, importam mesmo motivo. Note-se, aliás, que em Eça de Queirós o ruralismo e mesmo o tradicionalismo vieram corresponder a tendências literárias acentuadas, quais sejam o sentimento plástico e o talento descritivo. O campo sempre foi oportunidade para algumas das suas melhores descrições e ambientes mais sugestivos, a ponto de o sentirmos maio aprisionado em obras como O primo Basílio, onde a atmosfera urbana e a densidade das relações não lhe permitem maior desafogo. Os seus livros precisam respirar, e não sossegam enquanto não encontram uma nesga de natureza, por menor que seja, – como a paisagem ribeirinha que Afonso desfrutava do Ramalhete, espremida entre dois prédios altos (...)” Antonio Candido, Tese e antítese, p.39-59

domingo, 19 de dezembro de 2010

ROSA - Sentidos


"Zé Bebelo podia pautar explicação de tudo: de como a gente ia alcançar os hermógenes e dar neles grave derrota; podia referir tudo que fosse de bem se guerrear e reger essa política, com suas futuras benfeitorias. De que é que aquilo me servisse? Me cansava. E vim vindo, para a beira da vereda. Consegui com frio, esperei a escuridão se afastar. Mas, quando o dia clareou de todo, eu estava diante do buritizal. Um buriti - tetéia enorme. Aí sendo que eu completei outros versos, para ajuntar com os antigos, porque num homem que eu nem conheci - aquele Siruiz - eu estava pensando. Versos ditos que foram estes, conforme na memória ainda guardo, descontente de que sejam sem razoável valor:


Trouxe tanto este dinheiro
o quanto, no meu surrão,
p'ra comprar o fim do mundo
no meio do chapadão.

Urucúia - rio bravo
cantando à minha feição:
é o dizer das claras águas
que turvam na perdição.

Vida é sorte perigosa
passada na obrigação:
toda noite é rio-abaixo,
todo dia é escuridão...

Mas estes versos não cantei pra ninguém ouvir, não valesse a pena. Nem eles me deram refrigério. Acho que porque eu mesmo tinha inventado o inteiro deles. A virtude que tivessem de ter, deu de se recolher de novo em mim, a modo que o truso dum gado mal saído, que em sustos se revolta para o curral, e na estreitez da porteira embola e rela. Sentimento que não espairo; pois eu mesmo nem acerto com o mote disso - o que queria e o que não queria, estória sem final. O correr da vida embrulha tudo, a vida é assim: esquenta e esfria, aperta e daí afrouxa, sossega e depois desinquieta. O que ela quer da gente é coragem. O que Deus quer é ver a gente aprendendo a ser capaz de ficar alegre a mais, no meio da alegria, e inda mais alegre ainda no meio da tristeza! Só assim de repente, na horinha em que se quer, de propósito - por coragem. Será? Era o que eu às vezes achava. Ao clarear do dia" J.G.Rosa, Grande sertão: veredas, p.333-334.