domingo, 27 de fevereiro de 2011

Do sublime oculto

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Maçã
Por um lado te vejo como um seio murcho
Pelo outro como um ventre de cujo umbigo pende ainda o cordão [placentário

És vermelha como o amor divino

Dentro de ti em pequenas pevides
Palpita a vida prodigiosa
Infinitamente

E quedas tão simples 
Ao lado de um talher 
Num quarto pobre de hotel.

Manuel Bandeira, 25/2/1938.

Primeiro peço desculpas por quebrar o "cotovelo" da primeira estrofe (não consegui mantê-lo íntegro). Depois, gostaria de registrar aqui a sensibilidade e o arsenal teórico com que David Arrigucci Jr analisa esse poema de Bandeira em Humildade, Paixão e Morte: a poesia de Manuel Bandeira, Companhia das Letras, 1990. Da descrição da "natureza morta" da poesia como pintura que fala para olhos mudos aos arquétipos da vida e da morte e do amor divino. A simplicidade que se concebe como conhecedora do fato de que esconde o complexo da vida, infinitamente. "O infinitamente grande é visto na perspectiva do infinitamente pequeno: o maior dos mistérios, o da vida, se concentra numa parte ínfima da fruta. Nas pequenas pevides se oculta o sublime". "Assim, na maçã se encerra uma lição de vida e de poesia, pois imitando-a, se reconhece um ideal de estilo na simplicidade natural. E por ela, por fim se entende que a poesia, como a natureza, ama ocultar-se".

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