"Em resumo: tal como há dez anos, o Imaginário - ou seja, o conjunto das imagens e relações de imagens que constitui o capital pensado do homo sapiens - aparece-nos como o grande denominador fundamental onde se vêm encontrar todas as criações do pensamento humano. o Imaginário é esta encruzilhada antropológica que permite esclarecer um aspecto de uma determinada ciência humana por um outro aspecto de uma outra. Porque nós constatamos mais do que nunca, neste ano de 1969, as parcelizações universitárias das ciências do homem que, conduzindo ao gigantesco problema humano das visões estreitas e facciosas, mutilam a complexidade compreensiva (ou seja, a única fonte de compreensão possível) dos problemas postos pelo comportamento do grande macaco nu: o homo sapiens. Mais do que nunca, reafirmamos que todos os problemas relativos à significação, portanto ao símbolo e ao Imaginário, não podem ser tratados - sem falsificação - por apenas uma das ciências humanas. Qualquer antropólogo, quer seja psicólogo, sociólogo ou psiquiatra especializado, deve ter uma soma cultural tal que ultrapasse de longe - pelo conhecimento das línguas, dos povos, da história, das civilizações, etc. - a magra bagagem distribuída pela nossa Universidade sob o título de diplomas de Psicologia, Sociologia, Medicina... Para poder falar com competência do Imaginário, não nos podemos fiar nas exiguidades ou nos caprichos da nossa própria imaginação, mas necessitamos possuir um repertório quase exaustivo do Imaginário normal e patológico em todas as camadas culturais que a história, as mitologias, a etnologia, a linguística e as literaturas nos propõem. E aí, mais uma vez, reencontramos a nossa fidelidade materialista ao frutuoso mandamento de Bachelard: 'A imagem só pode ser estudada pela imagem...' Só então se pode honestamente falar do Imaginário com o conhecimento de causa e compreender-lhe as leis. E a primeira constatação revolucionária que há a fazer, com o autor da Psicanálise do fogo como com o do Manifesto do surrealismo, é que este Imaginário, longe de ser a epifenomenal 'louca da casa' a que a sumaríssima psicologia clássica o reduz, é, pelo contrário, a norma fundamental - a 'justiça suprema', escreve Breton - diante da qual a contínua flutuação do progresso científico aparece como um fenômeno anódino e sem significação". G. Durand, no Prefácio à terceira edição de As Estruturas Antropológicas do Imaginário, p. 18-19.
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